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Assinatura digitalizada: isso é válido?

Flávia Junqueira Soares   fjs@luc.adv.br

Pedro Figueiredo Sanches   pfl@luc.adv.br

Todos sabem que o Brasil é um país burocrático. Em 2010, a FIESP estimou que o custo da burocracia para o País correspondia a quase 2% de toda riqueza que produzia. 

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É impossível investir, fazer negócios ou assinar contratos sem se preocupar com várias formalidades, como reconhecimento de firma, cópias autenticadas, registro em cartório, testemunhas etc.

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Nesse contexto, as assinaturas eletrônicas vêm se tornando cada vez mais comuns e, não raro, as pessoas se questionam como assinar um documento eletrônico e qual a validade de uma assinatura digitalizada.

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Muitos costumam usar a assinatura digitalizada para assinar contratos, orçamentos, ordens de serviço e outros documentos. Assinam em um pedaço de papel, escaneiam a imagem da assinatura (ou tiram uma foto dela) e simplesmente a “colam” no arquivo que pretendem assinar. Mas isso é válido?

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A lei brasileira diz que não há uma forma específica para que um contrato tenha validade. Essa regra tem algumas exceções, sempre previstas na lei, como, por exemplo, a venda de um apartamento, cujo contrato deve sempre ser feito necessariamente em cartório; é a chamada escritura pública.

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​Mas, não sendo o caso de se seguir uma regra específica, o que vale é saber se as partes realmente quiseram assinar aquele contrato. É esse encontro de vontades que define se um contrato terá validade ou não.

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É impossível investir, fazer negócios ou assinar contratos sem se preocupar com várias formalidades, como reconhecimento de firma, cópias autenticadas, registro em cartório, testemunhas etc.

Assim, se o contexto da negociação deixar claro que as assinaturas digitalizadas (escaneadas) demonstram que as partes realmente quiseram participar daquele contrato, o seu uso é perfeitamente possível e válido.

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A assinatura é apenas uma das formas de se saber se houve o tal encontro de vontades. Mas não é a única.

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Com os desafios que a pandemia e a tecnologia trouxeram, o ideal é que todos conheçam, valorizem e exercitem a liberdade que a lei confere para a celebração de contratos, justamente por não prever forma específica para sua validade na grande maioria dos casos.

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Mas então para que serve o certificado digital? Sua função é dar autenticidade a uma assinatura em meio eletrônico. Ele simula (ou melhor, replica) a função dos cartórios de reconhecimento de firmas, atestando a identidade da pessoa.

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E isso é importante para situações que vão além da mera assinatura de documentos ou contratos, como, por exemplo, no acesso a informações sigilosas em sites do governo.

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Como uma medida de segurança, o site pede o certificado digital para que se tenha acesso a determinadas informações. Esse certificado atesta a identidade da pessoa que está tentando acessar o serviço. Ou seja, faz a validação de que ela é “ela mesma”.

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Apesar de o uso do certificado digital ser obrigatório (e recomendado) em situações específicas, algumas iniciativas tentam obrigar o seu uso em outros casos.

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Foi o que ocorreu quando a Medida Provisória nº 983/2020 foi convertida em lei, pois tentaram tornar obrigatório o uso do certificado digital para declaração de imposto de renda e para a venda de veículos.

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Em termos práticos, as pessoas seriam obrigadas a comprar um certificado digital – que tem um custo relativamente alto e precisa ser renovado de tempos em tempos – para fazer coisas cotidianas. Essas regras, entretanto, foram vetadas.

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Mas há também iniciativas que combatem a burocracia. É o caso da Lei nº 13.726/2018, que proíbe que órgãos públicos exijam reconhecimento de firma, obrigando o servidor público a comparar a assinatura do documento com aquela do documento de identidade para atestar sua autenticidade.

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Em resumo, a lei brasileira dá bastante liberdade para as pessoas participarem de contratos e negócios, não exigindo formalidades específicas para a grande maioria dos casos. A utilização de assinaturas digitalizadas não implica, necessariamente, na inexistência ou invalidade de um contrato.

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O que vale é saber se os envolvidos realmente quiseram fazer parte daquele ato. E-mails, mensagens de WhatsApp podem servir para demonstrar a intenção dos envolvidos. Qualquer iniciativa que restrinja essa liberdade deve ser vista como um retrocesso.

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1  https://www.fiesp.com.br/arquivo-download/?id=2017#:~:text=Estimamos%20o%20custo%20econ%C3%B4mico%20da,uma%20cesta%20de%20pa%C3%ADses%20Selecionados.&text=Isto%20corresponde%20a%20um%20custo,PIB%20(valores%20de%202009).


2 Inclusive, recentemente, o TJSP considerou válido o uso de uma assinatura eletrônica (proveniente de um site), que, embora não cadastrada ao ICP-Brasil (serviço oficial dos certificados digitais), foi considerada válida em razão de atestar que as partes realmente quiseram celebrar aquele negócio (TJSP. Agravo de instrumento nº 2132753-86.2020.8.26.0000. 31ª Câmara de Dir. Privado. Rel. Des. Francisco Casconi. j. 4.8.2020).

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